Blog Dependência e
Co-dependência Química, de autoria de Álaze Gabriel.
Autoria:
Giuliano
Gomes de Assis Pimentel; Bacharel em Educação Física.
Departamento de Educação Física, Universidade Estadual de
Maringá/UEM.
Edna
Regina Netto de Oliveira; Nutricionista e farmacêutica. Departamento de
Farmácia e Farmacologia, UEM.
Aparecida
Paulina Pastor; Licenciada em Educação Física. (in memorian)
RESUMO
O
objetivo deste estudo foi analisar as representações sociais de mulheres
dependentes químicas sobre a contribuição das práticas corporais em seu
processo de recuperação e inserção na sociedade. Quatorze internas de uma
instituição de tratamento foram entrevistadas e, também, observadas em relação
à participação em um programa de práticas corporais, sistematizadas na forma de
jogos e exercícios. As falas e práticas demonstraram contradições entre
sensações, justificativas e perspectivas em relação ao uso de seus corpos. Com
base nos resultados, se buscou compreender como as condições sociais de vida
medeiam o modo pelo qual essas mulheres se organizam em benefício de sua saúde.
Palavras-chave:
Corpo. Saúde. Dependência química. Práticas corporais. Educação Física.
INTRODUÇÃO
O
uso de drogas é influenciado por múltiplos aspectos, sendo difícil prever quais
pessoas ou comportamentos desencadearão o consumo. Se a complexidade de fatores
é inerente a essa problemática, não é surpresa que sejam necessárias diferentes
práticas para se efetivar o tratamento, podendo-se citar, entre elas, a
educação para o lazer do dependente químico por meio de práticas corporais
recreativas (Gimeno et al., 1998).
Sem
perder tal perspectiva multidisciplinar, este trabalho explorou, com base nas
representações sociais, significados presentes na adesão de mulheres, em
tratamento de dependência química, a um programa de práticas corporais1,
na forma de jogos e ginástica. Desta forma, o presente texto traz reflexões
sobre como as participantes percebem-se em relação a esse programa no seu
processo de recuperação.
Particularmente,
analisa-se o modo como seu imaginário ordena essas percepções quando o discurso
científico e terapêutico sobre as práticas corporais as justifica,
predominantemente, por um viés biológico e funcionalista. No processo de
recuperação, é procedimento difundido o consumo de líquidos associado à
realização de esforço corporal. Há muito tempo sabe-se que o suor é um veículo
para excreção de drogas e seus catabólitos (Kidwell, Blanco, Smith, 1997).
Assim, o efeito desejado é o aumento da transpiração e conseqüente excreção
desses produtos por meio do suor.
ASPECTOS
METODOLÓGICOS
A
pesquisa caracterizou-se como pesquisa-participante, uma vez que os
pesquisadores não procederam somente à descrição direta das características do
fenômeno, mas também interagiram na realidade investigada, na qualidade de atores.
Para
tanto, foi necessário o planejamento de atividades em consonância com o grupo
pesquisado. Em termos gerais, a intervenção constituiu-se pela realização de
práticas corporais como: ginástica localizada, ginástica aeróbica, alongamento,
jogos de aventura e atividades de recreação, por um período de sete meses, numa
instituição de recuperação para mulheres, sendo realizadas 55 aulas. A
intervenção foi desenvolvida duas vezes por semana, com duração de uma hora por
encontro.
A
população deste estudo foi constituída por mulheres com dependência química em
recuperação numa instituição filantrópica de Maringá-PR. Oriundas de famílias
com renda abaixo de quatro salários-mínimos, todas eram alfabetizadas, tendo as
mais jovens interrompido os estudos (Ensino Médio e, no caso de uma, Ensino
Superior) em decorrência do consumo de drogas. Quanto às drogas ingeridas pelas
mulheres, foram identificadas, em ordem decrescente: álcool, cocaína, maconha,
com casos de associação das três2.
Outras drogas também citadas, em menor recorrência, foram: tabaco, heroína, ecstasy,
quinino e cafeína. Ao todo, participaram 14 mulheres, com idade entre 19 e 51
anos3,
todas em fase de recuperação e internas. Elas consentiram em participar do
estudo, sendo garantido o anonimato das informantes (aqui numeradas de 1 a 14). A pesquisa foi
aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual de Maringá - UEM
(parecer n.219/2004).
Além
das observações diretas, foram realizadas entrevistas estruturadas em dois
momentos do trabalho. O primeiro momento diagnóstico foi realizado com o
objetivo de identificar o grupo amostral, as causas que o levaram à utilização
de drogas e os tipos de drogas consumidas. Também foram obtidas informações
sobre as atividades físicas, esportivas, artísticas e recreativas anteriormente
praticadas no tempo livre, e de que forma a Educação Física poderia contribuir
para a saúde do grupo. No segundo momento foram feitas discussões sobre as
representações das mulheres investigadas acerca de seus corpos e da ação das práticas
corporais realizadas sobre eles.
Ao
tomar as representações sociais como conhecimento-comum a determinado grupo,
assume-se sua constituição com base na interpenetração entre objetividade e
subjetividade. Nesse sentido, salienta Minayo (1998), ao se buscar, na área da
saúde, compreender os significados, tanto de ações quanto de pensamentos,
sentimentos e resistências de grupos populacionais, deve-se considerar tanto o
discurso quanto a base técnica.
Para
Menéndez (1998), a medicina praticamente se preocupa com as representações e
hábitos da população quando eles incidem negativamente sobre a saúde. Todavia,
cada "grupo social, independente de seu nível de educação formal, gera e
utiliza critérios de prevenção frente aos padecimentos que, real ou imaginariamente,
afetam sua saúde na vida cotidiana." E, ainda, todos os grupos são
possuidores de um saber frente aos padecimentos, visto que eles "são
estruturais a toda cultura, já que são decisivos para a produção e reprodução
da mesma" (Menéndez, 1998, p.75).
O
autor considera fundamental dar-se atenção às representações e ações coletivas
na efetivação de programas de saúde, mas adverte que, seja no conhecimento
comum ou no acadêmico, os conceitos não são neutros estando ligados,
conscientemente ou não, a teorias produzidas dentro de um marco referencial
específico. Conforme outros marcos teóricos usam o mesmo conceito, pode haver
discrepância, antagonismo ou complementaridade. É preciso, portanto, ir à raiz
dos entendimentos, evitando tomar como evidentes os significados do discurso.
Minayo
(1999) reitera esse cuidado lembrando que as falas não podem ser tomadas como
expressão pura da verdade, sob o risco de se acreditar serem os discursos
transparentes, sem contaminação de interesses, falhas de memória e ação da
ideologia. Tal perigo ocorre quando se percebe o real sem questioná-lo, tomando
o familiar como verdadeiro. Na investigação social, a análise do material
objetiva aumentar a compreensão de determinado aspecto cultural para além do
nível espontâneo da mensagem tomada como evidente.
Logo,
as representações de qualquer pessoa investigada podem corresponder ao oposto
do que está sendo relatado. Por isso, a observação participante foi fundamental
para conferir outras falas, gestos e ações gerados espontaneamente (ou não)
durante o cotidiano da instituição.
RESULTADOS
E DISCUSSÃO
Ao
discutirem a contribuição específica do programa de práticas corporais
orientado por profissional de Educação Física, embora diversas facetas fossem
lembradas, as mulheres destacaram a visão do esforço como uma forma de aquecer
o organismo, levando-o a expelir substâncias químicas pelo processo de
sudorese. Uma parcela significativa da população avaliada (62,5%) consegue
lembrar-se, exclusivamente, da ação catabólica, conforme explicitado nestas
falas:
Sim,
pois dizem que é bom transpirar para a desintoxicação. (Entrevistada 01)
Ajudando
a expelir do organismo a química do corpo e ocupando a mente. (Entrevistada 05)
Ajuda
na eliminação das toxinas. (Entrevistada 06)
Pode
contribuir eliminando as toxinas do corpo. (Entrevistada 08)
Entretanto,
em relação à bioquímica e à fisiologia, poderá a representação sobre o efeito
catabólico do exercício corresponder à realidade? O fato de o uso de álcool e
drogas ilícitas poder ser diagnosticado em amostras de sangue, urina, cabelo,
saliva, tecido adiposo, pele, suor e outros tecidos (Behrensdorf &
Steentoft, 2003), deve-se à presença da própria droga nesses locais ou de
compostos resultantes de seu catabolismo. Embora seja conhecido, há muito tempo,
que as drogas podem ser excretadas pelo suor, não existem relatos de trabalhos
que tenham quantificado a ação da atividade física na recuperação de
dependentes químicos em função da maior eliminação da droga pela sudorese.
Os
vários mecanismos pelos quais as drogas podem ser secretadas no suor incluem a difusão
passiva da droga do sangue para as glândulas sudoríparas e a migração
transdérmica da droga através da pele (Follador et al., 2004; Huestis et
al., 1999).
A
concentração das drogas no suor varia com uma série de fatores, dentre eles a
concentração da droga no sangue e a intensidade da transpiração (Huestis et
al., 1999). Considerando a difusão passiva da droga da corrente sanguínea para
o suor, a prática da atividade física, como parte do processo terapêutico,
levaria ao aumento do fluxo sanguíneo e da transpiração, aumentando esta via de
excreção da droga e seus catabólitos.
Quando
questionadas sobre a origem desse saber, as internas revelaram que se trata de
um conceito adquirido do discurso biomédico, difundido em revistas ou nas casas
de tratamento. Na verdade, parece ser uma informação presente em vários
ambientes, como revela a Entrevistada 12: "Aprendi na faculdade; em
clínica de recuperação. Li em livros que a atividade física deve ser priorizada
como auxiliar no tratamento de dependência química".
Surpreende,
porém, observar que o lócus desse aprendizado teórico tem sido mais os
ambientes escolares, destacando-se as aulas de Educação Física sobre saúde. O
senso comum criado sobre o esporte não ser droga e, portanto, contribuir para a
aquisição de saúde e manter a juventude longe dos vícios, vem colocando as
aulas de Educação Física à frente das campanhas escolares de prevenção ao uso
de substâncias psicoativas. Pelas informações veiculadas, os conteúdos da
cultura corporal acabam sendo reduzidos a funções sociais ou fisiológicas.
Uma
dificuldade na hegemonia assumida por essa disciplina escolar na prevenção ao
consumo de drogas é que esta venha a tomar tal problemática exclusivamente com
base em seu ponto de vista (e, o que é pior, em só uma de suas abordagens), com
tendência a buscar uma causalidade única.
Como
adverte Menéndez (1998, p. 75), "isolar o risco de beber, de fumar ou de
comer determinados alimentos pode ser eficaz para intervir no nível de condutas
individuais, mas não só anula o efeito compreensivo do problema, senão que
reduz a eficácia da intervenção". O autor se remete ao exemplo do fumo no
Reino Unido, mais difícil de ser abandonado entre pobres que nos extratos superiores.
Então, pergunta o autor, não seria a classe econômica/social o condicionante?
Entre a classe trabalhadora britânica, hábitos como fumar, ingerir cerveja, ter
contatos corporais violentos e conviver socialmente no pub, expressam o
modo de existir socialmente, a identificação cultural e a idiossincrasia dessas
pessoas, o que motivaria a sobrevivência dessas atitudes consideradas nocivas à
saúde (Menéndez, 1998).
Corroborando
essa inquietação, as participantes da pesquisa, quando questionadas sobre suas
atividades de lazer antes da dependência química, informaram, basicamente,
atividades físico-esportivas (sobretudo caminhada e esportes de quadra) e
leitura. Sua participação em práticas corporais e acesso à informação, embora
se possa questionar a qualidade de ambas, parece não tê-las blindado ou
protegido do consumo e dependência de drogas, particularmente álcool e cocaína,
as mais consumidas entre elas.
As
conversas com as mulheres dependentes químicas sugerem, entre outros aspectos,
que elas atribuem ao componente individual a razão principal para o abuso e
dependência de substâncias, relacionando-os à personalidade da pessoa. Já que
se exercitavam e estavam informadas sobre a temática, essas mulheres só
poderiam concluir pela sua "culpabilização", imputando-se como
responsáveis. Por esse exemplo, nota-se como, apesar da multicausalidade das
enfermidades, os atingidos pelas doenças tendem a assimilar a responsabilização
a uma causa específica.
Embora
não fossem levadas a refletir sobre a parcela da influência hereditária,
socioeconômica e ambiental na dependência, as internas apontaram variadas
dimensões (genética, religião, sociedade, comunidade, família, indivíduo) da
totalidade quando se remetiam às condições intervenientes à sua recuperação.
Nesse caso, a instituição de tratamento lhes encoraja a planejarem a vida
durante e após a internação, sob diferentes aspectos (vida familiar e
comunitária, trabalho, lazer, espiritualidade).
Sobre
esse parcelamento do indivíduo e de sua saúde em diversos componentes, sempre
em conflito, nunca em equilíbrio, nota-se, como Helman (2003, p. 27), uma
automação na imagem do corpo social. Para a autora, tal como a sociedade
ocidental se enxerga como indivíduos autônomos, o corpo é tomado como uma
junção de partes individuais que podem ser trabalhadas sem ameaçar a
sobrevivência do todo.
Devido
a esse parcelamento do corpo e de suas funções, o estudo acabou por encontrar
um olhar diferenciado da Educação Física no grupo de dependentes químicas. Como
já referido, a contribuição do movimentar-se é, sobretudo, relacionada à
sudorese. A prática corporal fica sendo representada como algo que extrai
humores do interior do corpo (dentro da pele) para expeli-los pelos poros da
epiderme (a barreira que separa o 'eu corpo' do mundo exterior). Não se trata
da cultura corporal como algo que amplia as sensações possíveis a partir do
invólucro epidérmico, mas de restringir a representação sobre o mesmo a
relações instrumentais.
Em
complemento, a visão higienista dessa relação faz do corpo um receptáculo que,
por enfraquecimento físico e moral, ingere substâncias maléficas à saúde do
indivíduo. Cada qual deve aquecer seu corpo, preferencialmente por meio de
movimentos aeróbios vigorosos que, além de serem úteis à transpiração, são
simbolicamente eficazes para se incorporar valores ascéticos4.
Se
o fundamental fosse transpirar, a sauna seria uma solução mais objetiva,
todavia fica evidente que o movimentar-se cumpre, também, uma função social.
Certas práticas corporais conduzem à assimilação de um autocontrole. E um corpo
suado pela 'malhação', embora esteja longe de ser agradável, expressa – aos
olhares de todos – a determinação do dependente químico em desincorporar
as drogas de seu organismo e, por assim representado, de seu íntimo.
Neste
caso, esse é um conceito já assimilado na sociedade e reforçado
institucionalmente. Conhecimento que as internas acabam reiterando sem, contudo,
mediarem-no com suas próprias sensações e reflexões, visto que nem em suas
conversas espontâneas expressam sua opinião particular sobre como sentem os
benefícios dessa eliminação da droga e seus catabólitos. Pelo contrário, quando
a maioria refere-se aos benefícios da prática corporal com base em suas
sensações, a representação predominante diz respeito ao relaxamento
(psíquico/somático) decorrente da atividade.
Em
relação à percepção de seu corpo em função da introdução do programa de
práticas corporais na casa de recuperação, as respostas correspondem ao
pressuposto de que essa experiência, mais que se constituir numa forma direta e
utilitarista de tratamento é, primeiramente, uma forma de a pessoa
relacionar-se com o corpo. A efetiva capacidade de melhorar o amor próprio e a
auto-estima é o que torna a prática corporal um componente benéfico e, a longo
prazo, um fator contribuinte para a qualidade de vida da pessoa, incluindo o
dependente químico.
Esses
resultados parecem corroborar a discussão de Carvalho (2001) sobre a
importância de considerar o "sujeito" da ação como o foco de nossa
reflexão, ao invés de priorizar a relação atividade física e saúde. A
intervenção em
Educação Física, por esse pressuposto, se deslocaria da busca
da saúde individual para focar no sujeito coletivo. E a saúde? Conforme a
autora, ao proporcionar contato com os conteúdos da cultura corporal, o
profissional da área fomentaria saberes que auxiliariam cada indivíduo a ser
mais emancipado e consciente. Assim, este poderia tomar suas próprias decisões
e edificar as estratégias mais coerentes com sua maneira de viver melhor em sua
coletividade.
Para
tanto, é necessário acessar esse sujeito coletivo da relação "atividade
física e saúde", adentrando sua forma de pensar. Não obstante, vale
advertir que as representações sociais são construções plurais, sujeitas a
contradições e à conciliação de pensamentos opostos. Assim sendo, tanto se vê
um indício desse viés de prática corporal manifestar-se como busca pelo prazer
quanto como uma espécie de remédio eficaz à promoção de algumas dimensões da
saúde. Estas respostas dizem respeito à percepção corporal que as internas
tiveram com sua adesão ao programa:
No
começo dói, mas depois relaxa o corpo e fica super bem. (Entrevistada
09)
Sim,
quando faço atividade física durmo melhor, como melhor, penso melhor e meu
corpo agradece. (Entrevistada 12)
Sim,
eu me sinto mais leve. (Entrevistada 14)
A
esse respeito, poderia ser resgatada a capacidade de os jogos e exercícios
estimularem momentos de catarse. Em acréscimo, a prática corporal de lazer está
associada à liberação de substâncias (endorfinas) que agem sobre o cérebro,
proporcionando prazer e relaxamento. De acordo com Sher (2001), os opióides
endógenos estão envolvidos na mediação do humor e os exercícios, por aumentarem
a liberação destes compostos, contribuem para o equilíbrio do humor nos seres
humanos. Frente à representação do corpo como um depositório de substâncias
tóxicas que devem ser expelidas, o prazer evocado pelo relaxamento mostra-se um
canal menos mecânico para se trabalhar o imaginário das dependentes químicas
acerca da importância das práticas corporais em sua recuperação e inserção
social.
Gimeno
et al. (1998) reforçam essa compreensão ao comentarem os efeitos da introdução
de jogos cooperativos e práticas de aventura numa instituição espanhola para
tratamento de dependentes químicos. Os jogos cooperativos objetivaram
restabelecer a sociabilidade em parâmetros de confiança. Já a aventura, além de
reforçar a necessidade do outro para sobreviver nas situações de risco,
possibilitou que ocorresse uma descarga adrenérgica frente à percepção de um
perigo e, posterior à superação do mesmo, a liberação de opiáceos.
Embora
não seja conclusiva, a relação entre jogos de vertigem e drogas é sugestiva e
revela ambigüidades, pois parece tanto contribuir para o ingresso quanto para a
'suspensão' do consumo de entorpecentes. Para Caillois (1994), as drogas seriam
a corrupção (exagero) da vertigem (ilinx), que é um impulso primário da
condição humana.
De
fato, tanto o uso de drogas quanto a prática de esportes radicais produzem
sensações de vertigem (representada como emoção, adrenalina). A
adrenalina "vicia", fazendo com que o sujeito busque, cada vez mais,
a repetição da atividade que leva à sua liberação. Ademais, há as endorfinas,
que são analgésicos naturais que entram em cena logo após a adrenalina, como
uma resposta a esse hormônio, causando uma sensação muito agradável de
entorpecimento e bem-estar e cessando as dores. Para Gimeno et al. (1998), os
jovens em tratamento estudados por eles buscavam trocar a dependência química
por uma vertigem natural e socialmente aceita (circo, caiaque, rapel).
A
análise de Caillois (1994) enriquece essa compreensão ao demonstrar que o
alcoolismo e o consumo de drogas são, em tese, um transbordamento do lúdico
reprimido no cotidiano. O autor considera que a vida civilizada em sociedade,
como existe hoje, exigiu a marginalização da vertigem, que acabou resistindo em
formas degradadas e diluídas. A intensificação das ações em função da
produtividade capitalista, exigindo um corpo que atendesse ao ritmo das novas
tecnologias, e o gosto pela velocidade, que tomou conta do homem moderno são,
conforme Caillois (1994), sobrevivências da vertigem no cotidiano.
Tal
contaminação estendeu-se para o campo perceptivo e sensorial de modo que o
fenômeno das drogas foi apenas uma das formas de as pessoas tentarem se adaptar
a um ritmo de produção cada vez mais vertiginoso. Quando a atitude psicológica
diante da vertigem se extravia de seu equilíbrio, pode-se diagnosticar que boa
parte da tensão vital, entre jogo e vida cotidiana, prosperou na busca de uma
vida alucinógena, excitante e imagética, que exclui a realidade,pelas drogas e
álcool.
Logo,
o frenesi na forma como a sociedade produz e se reproduz é obstáculo
fundamental para se conseguir viver sem consumir drogas. Não é por acaso que as
instituições de tratamento precisam localizar-se em áreas naturais ou rurais,
impondo um outro ritmo e uma concepção menos linear de tempo, para que consigam
obter avanços na recuperação do dependente químico. Embora, quimicamente, o
organismo dessas pessoas vá sempre sentir os efeitos da abstinência das drogas,
uma iniciativa no período pós-alta, que parece contribuir com o tratamento e
enfrentamento do cotidiano, seria poder optar por uma relação menos compulsiva
com o tempo social e a devolução da vertigem ao seu verdadeiro lócus, o
lúdico (daí os jogos de aventura).
Feita
essa reflexão, vale retomar o contexto do estudo, questionando sobre como a
intervenção da Educação Física pode vir a somar-se com outras iniciativas para
uma política de fortalecimento do dependente químico na sociedade. É importante
lembrar que as práticas corporais foram admitidas na instituição por se
acreditar na sua complementaridade à oração e ao trabalho terapêutico, pois a
direção da instituição acredita na recuperação do indivíduo em três níveis:
físico, mental e espiritual. Logo, foram pensadas numa perspectiva de atividade
física e recreação. Não obstante o limite dessa visão (idealista) de saúde, tal
contribuição não se restringiria somente ao tratamento, mas perduraria por toda
a vida, quando as mulheres, ao saírem da recuperação, continuariam envolvidas
com práticas corporais significativas em seu tempo livre.
Sem
desejar reforçar uma postura compensatória ou utilitarista, percebe-se que,
considerando a realidade estudada, as práticas corporais de lazer
proporcionaram sensações de prazer às mulheres que delas participaram. Essas
'novas' fontes de satisfação podem contribuir para que se opere a substituição
da recompensa percebida ao se consumirem substâncias químicas. O corpo deixa de
ser espaço de perdas (de substâncias) para se transformar em um território de
produção de sensações agradáveis. Sua vivência não é atrelada a uma função
social, mas começaria a apresentar-se mais autodeterminada pelo sujeito da
ação.
Por
isso mesmo, indagamos sobre as perspectivas das internas. As respostas mais
freqüentes foram: reconstituir família, estudar, ajudar outros dependentes
químicos, buscar sucesso profissional e ter prática corporal regular. Em
relação às atividades corporais pretendidas, foram lembradas, em ordem
decrescente: ginástica (localizada e hidroginástica), caminhada, lutas,
natação, e esportes coletivos. As atividades de aventura foram citadas apenas
entre as internas mais jovens.
Interessante
notar que a representação sobre a sudorese perde força em relação ao futuro. As
internas planejam a prática corporal para a fase de inserção na sociedade
pensando em objetivos estéticos (emagrecimento) e de saúde integral:
Fazer
ginástica localizada porque além de manter o corpo beneficia a mente.
(Entrevistada 14)
Um
exercício que ajuda fisicamente e mentalmente. (Entrevistada 08)
Encontrar
o equilíbrio entre corpo, alma e espírito. [...] Consegui emagrecer dez quilos
com abdominais e voleibol. (Entrevistada 02)
Mesmo
que soe previsível a predileção feminina pela ginástica localizada,
independente de sua condição como dependente química e, como segunda opção, a
caminhada, é preciso questionar qual a possibilidade dessas mulheres efetivarem
suas intenções após o período de tratamento. Embora a caminhada seja uma
atividade possível de ser realizada em praças, ruas e parques públicos, as
representações apontam para uma visão predominantemente de consumo quando se
pergunta, às mulheres, o local no qual podem praticar a atividade desejada.
Estas se imaginam em clubes ou academias. Mesmo sendo estimado um custo para
matrícula e mensalidades, é forte a representação da academia como local ideal.
Dois
aspectos complementares, mas antagônicos, precisam ser desmembrados da
constatação sobre a hegemonia da academia entre as representações sociais.
Primeiramente, os custos podem representar baixa adesão e aderência a alguma
atividade física regular, levando tanto a sentimentos de frustração como
reiteração do conformismo cultural e baixa criatividade. Vale acrescentar que o
entendimento do problema como de resolução individual pode reforçar a limitada
mobilização social em torno de reivindicações por políticas públicas de esporte
e lazer voltados à saúde. Aliás, a busca por academia e outros empreendimentos
particulares referenda a gradual substituição do poder público pela rede
privada, a qual, geralmente, não está acessível aos grupos especiais e mais
carentes da sociedade (Carvalho, 2001).
Mas,
por outro ponto de vista, o desejo de fazer ginástica em academia pode ser
interpretado para além da querela em torno da privatização dos equipamentos de
lazer físico-desportivo. Metade das entrevistadas, ao manifestarem o desejo por
freqüentar academias, estranhamente não possuíam vivência desse ambiente. Seu
imaginário, aliás, parece mais conduzido pelas expectativas em relação a redes
de sociabilidade e ao prazer estético em meio à exibição de corpos saudáveis.
E, considerando a apreensão e insegurança da pessoa após tratamento, estar na
academia, ao invés de em lugares públicos e abertos, pode significar a busca
por um local seguro e, ao mesmo tempo, com mais vigilância e cobrança por
atitudes consideradas saudáveis. Para elas, a presença dos colegas e do
instrutor é um estímulo à aderência ao exercício, mesmo a custo de sua
autonomia.
Um
aspecto importante para essa reflexão é que a relação das mulheres com as
práticas corporais e com as substâncias psicoativas é duplamente desfavorável:
as mulheres têm menos acesso às oportunidades físico-esportivas de lazer
(Pitanga & Lessa, 2005) e possuem menos chance de ter uma boa evolução na
recuperação quando comparadas aos homens (Kerr-Corrêa et al., 1999).
Por
fim, quando essas mulheres se referem à busca do equilíbrio, vale recorrer ao
questionamento teórico dessa visão idealizada de saúde, pois nem sempre as
condições necessárias para esse equilíbrio estão disponíveis. Como salienta
Carvalho (2001, p. 14) "tem saúde quem tem condições de optar na
vida". Estariam imbricados não somente o suposto equilíbrio
físico-mental-espiritual (até porque é necessário desequilibrar-se para se
equilibrar), mas possibilidades relativas às condições de vida tanto em sua totalidade,
quanto no acesso ao lazer, trabalho, cuidados à saúde e educação. Porém, essas
políticas parecem não produzir efeito na sociedade brasileira, cuja velocidade
compulsiva tem servido a um modelo de desenvolvimento desigual. Assim, já em
sua gênese, a política de inclusão do dependente químico resultaria em sua
exclusão.
CONSIDERAÇÕES
Algumas
limitações podem ser citadas para o presente estudo. Como limitante podemos
destacar o fato de que as entrevistas foram realizadas no espaço físico da
instituição e, mesmo garantindo o anonimato absoluto, isso pode ter interferido
nas falas das participantes, que podem ter se sentido vulneráveis e, por isso,
omitido ou camuflado sentimentos e emoções. Embora todas as mulheres internas
na instituição tenham participado do estudo, outro fato a destacar seria o
tamanho da amostra que, por ter sido pequeno, costuma ser considerado um fator
limitante, não permitindo generalizações. Todavia, ao buscar um contexto
particular, este trabalho ensejou justamente desestabilizar os discursos
fundados nas generalizações.
Afinal,
é válido que cada grupo possua sua própria visão de mundo e de saúde. Helman
aponta (2003, p. 94) que, em "sociedades culturalmente mistas, um modelo
único e inflexível de saúde não pode ser mais aceitável. Por isso a medicina
tem de ser ciência social aplicada além de ser ciência médica aplicada".
Assim, uma visão crítica do ser humano em sociedade não implica a negação de
outros campos do saber (Carvalho, 2001), pois tão perigoso quanto o reducionismo
biológico é o reducionismo social, sendo importante a consideração -
contextualizada - dos diferentes saberes sobre saúde e sociedade (Minayo,
1998).
No
caso deste estudo, evidenciaram-se múltiplas representações coletivas passíveis
de significar a cultura corporal sistematizada num grupo de mulheres
dependentes químicas. Primeiro, destacou-se a consideração dessas mulheres
sobre o exercício como meio de aumentar a sudorese, isto é, o transporte de
substâncias indesejáveis para fora do organismo. Nessa representação, há
coerência com discursos presentes na Medicina e na Educação Física. Vêem-se
indissociáveis: os valores morais, cujo ascetismo apregoa o esforço físico como
um sacrifício para se adquirir mais autocontrole; a visão biomédica de
'equilíbrio e desequilíbrio', para a qual o funcionamento saudável do corpo
depende do equilíbrio harmônico de certos componentes dentro do corpo. A
dependência seria decorrência da carência ou excesso de certas substâncias no
corpo, havendo necessidade de se expelirem os catabólitos da droga.
Nessa
transferência do 'mal' localizado nos humores para o suor, a pele delimita a
territoriedade do corpo, divisa o 'eu interno' do mundo exterior, realizando
trocas com esse meio, de forma a absorver sensações e experiências mas, também,
eliminar substâncias indesejadas à homeostase corporal.
Porém,
não se trata somente de fazer o corpo expelir. Há a dimensão de individuação
que a pele proporciona, permitindo ao sujeito tomar contato sensível com a
realidade e dando-lhe elementos para diferenciar o que é externo daquilo que é
intrínseco ao corpo. Então, a prática corporal (seja recreativa, de aventura ou
expressiva) com o dependente químico trata de fazer a pele receber, acariciar,
respirar e relacionar-se. Estas possibilidades são vistas como múltiplas formas
dessa pele-território comunicar-se com a exterioridade, agindo sobre ela, e
informar à interioridade sobre sensações como: tensão, dor, prazer, pressão,
frio, calor ou vertigem.
Outras
representações sobre o corpo estiveram presentes e precisariam ser
consideradas, entre as quais a dimensão estética, revelando a subjetividade
pautada pelo desejo de configurar um corpo belo, o qual pode redundar em um
apelo mercadológico. Os gestos e falas das internas ainda evidenciaram resquícios
de busca do prazer, relacionados a sentimentos de recompensa, relaxamento e
excitação por meio das atividades. Estas, às vezes, desencadearam em momentos
subversivos, tornando lícitos comportamentos proibidos na casa de recuperação
(como, por exemplo, ouvir música não-religiosa).
Finalmente,
em menor grau, as práticas corporais, como modo de (educação para o) lazer,
foram referidas, pelas internas, como positivas ao processo geral de
recuperação, influenciando no controle de condições particulares (como controle
do estresse e da ansiedade, sociabilidade, qualidade e quantidade de sono).
Para o dependente químico, essas carências são iguais ou mais importantes, pois
a abstinência da droga desencadeia diversos sintomas, tornando necessária a
ocupação do tempo com atividades.
Porém,
o mero uso profilático das atividades, sem direcioná-las para o desenvolvimento
das internas, desqualifica o papel pedagógico do profissional de Educação
Física. Nesse sentido, há de se pensar nesses conteúdos físico-esportivos como
uma dupla educação para a vida. Primeiro porque, por meio dessas atividades,
conceitos (como o conhecimento sobre os efeitos do exercício na eliminação de
toxinas) podem ser descobertos e rediscutidos pela práxis. Segundo, na
perspectiva da autonomia, o próprio aprendizado dos exercícios e jogos pode vir
a constituir-se como escopo para novas experiências, as quais podem ser
incluídas no lazer dessas mulheres, após sua liberação.
Em
complemento, é necessária uma política pública que organize esses aspectos ao
longo do período de inserção do dependente químico na sociedade. Para tanto,
urge identificar como cada coletividade cria estratégias para dar continuidade
as suas experiências corporais na fase pós-internação, considerando a interação
destas com o atendimento às outras condições de vida e seus limites numa
sociedade já narcotizante em sua essência. A propósito, formar pessoas para
autonomia, de modo que sejam capazes de escolher dentro das possibilidades
existentes e, concomitantemente, lutar pela sua ampliação, é condição primeira
quando se destaca a dimensão político-pedagógica da intervenção profissional.
COLABORADORES
Os
autores Giuliano Gomes de Assis Pimentel, Edna Regina Netto de Oliveira e
Aparecida Paulina Pastor participaram, igualmente, da elaboração do artigo, de
sua discussão e redação. Giuliano Gomes de Assis Pimentel e Edna Regina Netto
de Oliveira também participaram da revisão do texto.
REFERÊNCIAS
BEHRENSDORFF, I.; STEENTOFT, A.
Medical and illegal drugs among Danish car drivers. Accid. Anal. Prevent.,
v.35, p.851-60, 2003.
CAILLOIS,
R. Los juegos y los hombres: la máscara y el vértigo. México: Fundo de
Cultura Económica, 1994.
CARVALHO,
Y.M. Atividade física e saúde: onde está e quem é o "sujeito" da
relação? Rev. Bras. Ciênc. Esp., v.22, n.2, p.9-22, 2001.
FOLLADOR, M.J.D. et al. Detection of
cocaine and cocaethylene in sweat by solid-phase microextraction and gas
chromatography/mass spectrometry. J. Chromatogr. B, v.811, p.37-40, 2004.
GIMENO,
J.M.R. et al. La prevención de drogodependencias mediante actividades cooperativas
de riesgo y aventura. Apunts, n.59, p.46-54, 1998.
HELMAN,
C.G. Cultura, saúde e doença. 4.ed. Porto Alegre: Artmed, 2003.
HUESTIS, M.A. et al. Sweat testing
for cocaine, codeine and metabolites by gas chromatography-mass spectrometry. J.
Chromatogr. B, v.733, p.247-64, 1999.
KERR-CORRÊA,
F. et al. A importância da gravidade da dependência e do gênero para a evoluçäo
de dependentes de drogas. Medicina (Ribeirão Preto), v.32, supl.1,
p.36-45, 1999.
KIDWELL, D.A.; BLANCO, M.A.; SMITH,
F.P. Cocaine detection in a university population by hair analisis and skin
swab testing. Forensic Sci. Int., v.84, p.75-86, 1997.
MENÉNDEZ,
E.L. Antropologia médica e epidemiologia. Processo de convergência ou processo
de medicalização? In: ALVES, P. C.; RABELO, M. C. (Orgs.). Antropologia da
saúde: traçando identidade e explorando fronteiras. Rio de Janeiro: Relemé
Dumará, 1998. p.71-94.
MINAYO,
M.C.S. O desafio do conhecimento. 6.ed. São Paulo: Hucitec, 1999.
______.
Construção da identidade da antropologia na área da saúde: o caso brasileiro.
In: ALVES, P.C.; RABELO, M.C. (Orgs.). Antropologia da saúde: traçando
identidade e explorando fronteiras. Rio de Janeiro: Relemé Dumará, 1998.
p.29-46.
OLIVEIRA,
J.F.; PAIVA, M.S.; VALENTE, C.L.M. Representações sociais de profissionais de
saúde sobre o consumo de drogas: um olhar numa perspectiva de gênero. Ciênc.
Saúde Coletiva, v.11, p.473-81, 2006.
PITANGA,
F. J.G.; LESSA, I. Prevalência e fatores associados ao sedentarismo no lazer em adultos. Cad. Saúde
Pública, v.21, n.3, p.870-7, 2005.
SCIVOLETTO,
S. et al. Relação entre consumo de drogas e comportamento sexual de estudantes
de 2º grau de São Paulo. Rev. Bras. Psiquiatr., v.21, n.2, p.87-94, 1999.
SHER, L. Role of endogenous opioids
in the effects on light on mood and behavior. Med. Hypoth., v.57,
n.5, p.609-11, 2001.
1
Prática corporal é entendida como toda manifestação gestual, como os
exercícios, os jogos e as danças, com significado cultural compartilhado em
determinado contexto. O termo atividade física é utilizado para designar quando
as práticas corporais são pensadas em relação ao esforço ou gasto energético
demandados. Aqui o termo recreação refere-se à condução de atividades lúdicas
destinadas, predominantemente, à diversão.
2
A literatura aponta essa característica como mais comum em homens; mulheres
tendem a consumir drogas ilícitas em menor freqüência, embora a proporção de
usuários não tenha diferença significativa (Oliveira, Paiva & Valente,
2006; Scivoletto et al., 1999).
3
Essa distribuição de faixa etária encontrada na população coincide com a
consideração de Helman (2003), para a qual mulheres entre 18 e cinqüenta anos
são mais suscetíveis de terem frustradas as tentativas de enfrentar as novas
circunstâncias da sua vida.
4
No Ocidente, é recorrente a existência de versões medicalizadas
reproduzindo leituras morais. Helman (2003) exemplifica com as representações
coletivas, na medicina, sobre as causas da obesidade. As pesquisas sobre esse
tema indicam que o diagnóstico causal sobre "comer muito e exercitar-se
pouco" seriam traduções recentes de alguns pecados capitais. Na raiz da
questão reitera-se a desaprovação moral da gula e da preguiça, assim como da
falta de autocontrole.