Blog “Dependência e
Co-dependência Química”, de autoria de Superdotado Álaze Gabriel. Disponível em
http://dependenciaecodependenciaquimica.blogspot.com.br/
RESUMO
OBJETIVO: Segundo a
Organização Mundial da Saúde, as propagandas de medicamentos devem ser
fidedignas, exatas, verdadeiras, informativas, equilibradas, atualizadas e
passíveis de comprovação. O objetivo do estudo foi avaliar as propagandas de
medicamentos psicoativos divulgadas a médicos, em relação à concordância das
informações contidas nas peças publicitárias com as suas respectivas
referências bibliográficas e à acessibilidade dessas referências citadas.
MÉTODOS: A coleta de
dados foi realizada durante o ano de 2005, em Araraquara, SP. Foram coletadas e
analisadas propagandas de 152 medicamentos, num total de 304 referências. As
referências bibliográficas foram solicitadas aos serviços de atendimento ao
cliente dos laboratórios e consultadas nas bibliotecas da rede UNESP (Ibict,
Athenas), BIREME (SciELO, PubMed, periódicos catalogados de acesso livre) e
periódicos CAPES. As afirmações das propagandas foram conferidas com as das
referências por meio da técnica de análise de conteúdo.
RESULTADOS: Das referências
citadas nas propagandas, 66,7% foram acessadas. De 639 afirmações
identificadas, foi possível analisar 346 (54%). Verificou-se que 67,7% das
afirmações das propagandas conferiam com suas referências e as demais não
conferiam ou conferiam parcialmente. Entre as propagandas analisadas, foi
observada média de 2,5 (1-28) referências citadas por propaganda. No corpo das
propagandas, foram identificadas 639 informações que estavam explicitamente
associadas à pelo menos uma das referências citadas (média de 3,5 informações
por propaganda).
CONCLUSÕES: Os resultados
evidenciaram a dificuldade de acesso às referências. As mensagens de eficácia,
segurança, custos, entre outras, nem sempre estão respaldadas por estudos científicos.
São necessárias mudanças nas exigências legais e fiscalização efetiva das
promoções de medicamentos.
DESCRITORES: Psicotrópicos.
Propagandista de Laboratório. Controle da Publicidade de Produtos. Sistemas de
Medicação no Hospital. Política Nacional de Medicamentos. Revisão [Tipo de
Publicação]. 530 Análise de propaganda de medicamentos Mastroianni PC et al
Segundo a Organização Mundial da Saúde
(OMS), as propagandas de medicamentos devem ser fidedignas, exatas,
verdadeiras, informativas, equilibradas, atualiza-das e passíveis de
comprovação; os textos e ilustrações devem ser compatíveis com os dados
científicos. A promoção não ética de medicamentos é um problema na maior parte
do mundo, gera o uso irracional e pro-move superprescrição, automedicação e
abuso.
A situação é mais grave em países em
desenvolvimento, como no Brasil, onde estudos têm mostrado diferenças nas
informações entre propagandas veiculadas nos periódicos médicos do Brasil
Inglaterra e Estados Unidos, gerando um padrão duplo de informação. As
informações veiculadas nas propagandas brasileiras são mais subjetivas e
incompletas quando comparadas com as propagandas inglesas e americanas dos
mesmos medicamentos.
INTRODUÇÃO
No caso das propagandas dos medicamentos
psicoativos a situação é mais grave, pois tendem a ser menos informativos que
as propagandas de outras classes terapêuticas.Além disso, as propagan-das
favorecem esteriótipos entre os distúrbios psiquiátricos e o gênero, com
discrepâncias nas proporções em que aparecem figuras de homem e mulheres.
Alguns trabalhos têm relatado
desinformação e desequi-líbrio nas informações contidas nas propagandas, como
as que favorecem o uso como: indicação, apresentação e posologia são mais
freqüentes e com maior destaque em tamanho e cor do texto. As informações que
restringem o uso, como contra-indicação, advertências, precauções e reações
adversas, quando presentes, recebem o menor destaque com difícil visualização.
Todavia, nesses estudos, as mensagens
publicitárias não foram conferidas com as respectivas referências
bibliográficas citadas. Há poucos trabalhos sobre fidedignidade, exatidão e
veracidade das informações contidas nas propagandas promocionais e outras
práticas cujo objeto seja a divulgação, promoção ou comercialização de
medicamentos de produção nacional ou importados, quaisquer que sejam as formas
e meios de sua veiculação, incluindo as transmitidas no decorrer da programação
normal das emissoras de rádio e televisão. Diário oficial da União. 1 dez 2000.
O presente estudo teve por objetivo
avaliar as pro-pagandas de medicamentos psicoativos divulgadas a médicos em
relação à fidedignidade das informações contidas nas peças publicitárias com as
suas respectivas referências bibliográficas citadas e sua acessibilidade.
MÉTODOS
A amostra foi composta por propagandas
de medi-camentos psicoativos divulgadas aos médicos pelos propagandistas (ou em
propaganda) das indústrias farmacêuticas em clínicas, hospitais e postos de
saúde. A coleta de dados foi realizada durante o ano de 2005, no município de
Araraquara, no estado de São Paulo. Os medicamentos psicoativos são sujeitos ao
controle especial, dispensados apenas sob prescrição retida.
As propagandas de medicamentos
divulgadas pelas indústrias farmacêuticas são as mesmas em todo o território
nacional. Portanto, as peças coletadas no município de Araraquara podem ser
consideradas representativas das propagandas de medicamentos psicoativos
divulgados aos prescritores em todo o território nacional. Para obtenção do
material publicitário, foram con-tatados os médicos de hospital, de unidades
básicas de saúde e de clínicas, sendo explicado o objetivo do estudo. Aos que
aceitaram colaborar, foi-lhes solicitado que guardassem o material publicitário
recebido para posterior coleta mensal pela equipe.
Não houve diferenças de propagandas
coletadas segundo o local de coleta, pois era o mesmo propagandista de cada
laboratório que visitava o hospital, unidades básicas de saúde e as clínicas,
deixando os mesmos materiais.As referências bibliográficas foram solicitadas a
partir dos respectivos números do Serviço de Atendimento ao Cliente ou Serviço
de Atendimento ao Médico (SAC/SAM) informados nas propagandas. Quando o SAC/SAM
tinha a referência, a encaminhava pelo correio. Em seguida, foram pesquisadas
nas bibliotecas da rede UNESP (Ibict, Athenas), BIREME (Scielo, PubMed,
periódicos catalogados de acesso livre) e outros bancos de dados disponíveis na
Internet, como Periódicos CAPES.
Foram registradas as informações das
referências bibliográficas quanto a fonte de acesso (laboratório, biblioteca ou
não encontrada) e situação de análise (analisada, não analisada e motivo de não
análise).A análise de conteúdo de cada uma das referências obtidas seguiu
roteiro a partir de “leitura flutuante” das peças publicitárias e respectivas
referências. O roteiro contemplou as seguintes informações:parte I –
identificação da propaganda: número de identificação da propaganda, nome do
medica-mento, princípio ativo, classe terapêutica, nome do laboratório, número
SAC/SAM, referências citadas e quantidade; parte II – análise das referências
bibliográficas citadas: tipo de referência (se artigo publicado e in-dexado,
publicado e não indexado, documento não publicado, citação de livro, material
do laboratório, apresentação em congresso, guias de sociedades, revista de
preço de medicamentos e outros); tipo de metodologia empregada no estudo
(meta-análi-se, ensaio clínico, coorte, caso-controle, editorial, revisão,
levantamento, farmacovigilância), e grau de concordância: se concorda, não
concorda, ou concorda parcialmente com as afirmações das peças publicitárias.
A fim de evitar subjetividade ou
interpretações diver-gentes, toda à análise de conteúdo foi realizada em
duplicata por analistas independentes; em caso de diver-gências, um terceiro
analista analisava o conteúdo. As referências foram classificadas segundo a
metodologia empregada e o grau de evidência recomendado para tomada de decisão.
Julgou-se como “concorda” as citações
cujas afir-mações das peças publicitárias foram encontradas na referência
citada; “concorda parcialmente” quando pelo menos uma ou parte das afirmações
nas peças foram encontras na referência citada; e “não concorda”, quando não
encontradas quaisquer das afirmações da peça na referência citada. Foi criado
um banco de dados em planilha eletrônica para organizar as informações
coletadas. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
da Unifesp, sob protocolo nº 176/06.
RESULTADOS
Foram coletadas 167 diferentes
propagandas de medi-camentos psicoativos divulgadas por 25 laboratórios
farmacêuticos. As propagandas eram na sua maioria de medicamentos
antidepressivos (41,9%) e ansiolíticos (24,5%). Foram excluídas da amostra 15
propagandas (provenientes de quatro laboratórios) que não citavam qualquer
referência bibliográfica. Entre as 152 propagandas analisadas de 21
laboratórios farmacêuticos, foi observada uma média de 2,5 (1-28) referências
citadas por propaganda, totalizando 395 referências. No corpo das 152
propagandas, foram iden-tificadas 639 informações que estavam explicitamente
associadas a pelo menos uma das referências citadas (média de 3,5 informações
por propaganda).
Dois laboratórios se recusaram a
colaborar com o fornecimento das referências solicitadas. Entre os que
colaboraram, embora a maioria alegasse não ter as referências arquivadas na
empresa, informaram que as solicitariam na matriz ou em bibliotecas médicas. O
tempo de envio das referências variou de três dias úteis a seis meses. Apenas
um laboratório entregou todas as referências bibliográficas; os demais
entregaram, em média, menos da metade das citadas, resultando em 107 (27%)
referências obtidas. Obteve-se acesso a outras 156 (39,5%) referências
bibliográficas em bibliotecas ou bases de dados citadas em Métodos. O total de
refe-rências obtidas foi de 263. As demais referências (132; 33,5%) não foram
obtidas ou porque os laboratórios não as tinham disponíveis em suas sedes ou
não estavam indexadas nas bases de dados pesquisadas ou não eram publicadas.
A maioria das referências bibliográficas
era provenien-te de estudos publicados em revistas indexadas 291 (73,7%) ou não
indexada 13 (3,3%). A partir dessas 304 referências, foi possível avaliar o
tipo de estudo de 260 artigos, acessando o artigo na íntegra ou seu resumo.
Observou-se que a maioria dos estudos
era ensaios clíni-cos (N=116), o que corresponde ao grau elevado de evi-dência
para decisão na escolha terapêutica. O segundo tipo de estudo mais freqüente
foi revisões bibliográficas (N=94) que correspondem ao menor grau de evidência
na decisão terapêutica,sendo observada também a citação de estudos não
recomendados, como pré-clínicos (N=12), levantamentos epidemiológicos (N=6) e
avalia-ção da qualidade de vida (N=1).
Quanto ao grau de conferência entre as
afirmações das propagandas e suas respectivas referências bibliográfi-cas
citadas, 263 referências disponíveis (107 entregues pelos laboratórios e 156
encontradas em bibliotecas e banco de dados) eram responsáveis por 346
mensa-gens publicitárias analisadas, correspondendo a 54% (346/639) de todas as
mensagens encontradas nas propagandas coletadas. Motivos da dificuldade no
acesso às referências bibliográficas citadas nas propagandas de medicamentos
psicoativos. Araraquara, SP, 2005.
Na maioria das mensagens analisadas
(234/346; 67,7%) foi possível encontrar as frases ou as infor-mações na
referência citada. Em 15,6% (54) das mensagens, as informações estavam
incompletas ou referiam parcialmente a referência bibliográfica; e em 16,7%
(58) das mensagens não foi possível encontrar qualquer das informações da
propaganda na referência bibliográfica citada. Os motivos de não concordância
ou concordância parcial foram informações não encontradas ou contra-ditórias
aos trabalhos referendados, tais como estudos conduzidos com fármacos
diferentes do medicamento da propaganda, ou revisões de classes terapêuticas
que não traziam informações específicas sobre o me-dicamento da propaganda ou
estudos conduzidos em adultos jovens e as propagandas afirmavam “seguro em idosos”.
Foram também observadas informações com extrapolação de resultados, como
aumento do nível de significância estatístico; estudos conduzidos em animais
mas afirmações nas propagandas eram para humanos; estudos conduzidos em
pacientes com uma única morbidade e as propagandas afirmavam eficácia para duas
ou mais morbidades ou ainda eficácia em pacientes com co-morbidades não
contempladas no estudo, tais como paciente com insuficiência renal ou hepática
(Tabela 3).
DISCUSSÃO
Dados do presente estudo evidenciaram a
dificuldade no acesso às referências bibliográficas citadas nas propa-gandas de
medicamentos psicoativos. Dados semelhan-tes foram encontrados por Villanueva
et al (2003) ao analisarem anúncios de medicamentos publicados em seis jornais
espanhóis. Os autores não obtiveram acesso a 18% das referências citadas por
serem monografias ou outros dados não publicados.
Um profissional prescritor teria mais
dificuldade se qui-sesse conhecer o material referendado nas propagandas de
medicamentos. Há necessidade de alterações na legislação sanitária vigente
referente à regulamentação das propagandas de medicamentos, proibindo a citação
de material sem caráter científico, tais como revistas de preço de
me-dicamentos. Outra exigência seria que os laboratórios farmacêuticos tivessem
disponíveis em suas home pa-gesos artigos originais na íntegra e só façam
citações de estudos cuja metodologia empregada seja de um grau de evidência
recomendável para tomada de decisão te-rapêutica. Deve-se permitir a citação preferencialmente
de estudos publicados, e evitar apresentações orais ou pôsteres divulgados em
reuniões científicas.
Geralmente as propagandas apresentam
informações incompletas, resumidas, inconsistentes e diferentes dos estudos
citados,sempre favoráveis de indicação terapêutica, eficácia, segurança e
custo. Embora trabalhos anteriores relatem baixa freqüência de refe-rências
bibliográficas nas mensagens publicitárias, no presente estudo 91% das
propagandas apresentavam pelo menos uma referência. Observa-se que os
labora-tórios, atualmente, tendem a utilizar-se de referências bibliográficas
como estratégias de marketing nos ma-teriais promocionais.
Os laboratórios farmacêuticos geralmente
utilizam-se de estudos publicados em jornais indexados e reconhecidos na classe
médica, cuja metodologia seja do tipo ensaios clínicos randomizado (44,6%),
preferencialmente indicado para decisão na escolha do tratamento. Em
contrapartida, 36,1% das publicações eram revisões bibliográficas, que são
menos indicadas,cujas mensagens nas propagandas eram sempre as infor-mações
favoráveis aos fármacos e omitiam as ressalvas. Tipos de metodologias
empregadas nos estudos referendados nas propagandas de medicamentos
psicoativos.
A maioria das mensagens analisadas
(67,7%) conferiu com as referências bibliográficas porque se considerou de
acordo toda a vez que havia a informação citada, independente de existir outras
considerações. O art. 15 da RDC 102/00 estabelece que “as citações, tabelas ou
outras ilustrações extraídas de publicações científicas utilizadas em qualquer
propaganda, publicidade ou promoção, devem ser fielmente reproduzidas e
espe-cificar a referência bibliográfica completa”. A maioria das citações era
proveniente de revisões bibliográfi-cas que contemplam os prós e contras; os
prós eram citados nas mensagens publicitárias e quando eram provenientes de
ensaios clínicos eram citados apenas os resultados positivos.
Trabalhos têm relatado vieses de
publicação,ou seja, os estudos com resultados positivos e que favorecem o uso dos
medicamentos são mais rapidamente publi-cados, enquanto que os dados não
favoráveis levam muito mais tempo ou nem são publicados, o que poderia
justificar a maioria de afirmações analisadas conferirem com as referências
citadas. Ou ainda, os laboratórios farmacêuticos financiam ensaios clínicos e
relatam os seus resultados como parte de suas estratégias de ma-rketinge as
afirmações que conferem tendem sempre a serem favoráveis ao medicamento.
No entanto, questiona-se se a maioria
das afirmações estaria de acordo caso fosse possível o acesso das 132
referências não encontradas, responsáveis pelas as 293 afirmações não
analisadas (46%). A falta de exatidão nas mensagens publicitárias nas
propagandas de medicamentos psicoativos foi obser-vada em 32,3% das informações
analisadas. Dados semelhantes foram encontrados por Villanueva et al (2003) ao
conferirem as mensagens publicitárias em anúncios de medicamentos
antihipertensivos publicadas em jornais médicos espanhóis com suas respectivas
referências (44,1%) e por Gómez-Garcia et al (2005) ao analisarem materiais
promocionais entregues aos médicos de família na Espanha (44,5%).
O motivo da não conferência ou
conferência parcial no presente estudo foi semelhante ao encontrado em
trabalhos conduzidos na Espanha,tais como: ausên-cia da informação, estudo de
outro fármaco, pacientes em condições específicas não contempladas, não havia
diferenças significativas, extrapolação de indicações ou patologias e
conclusões diferentes das informações afirmadas nas peças publicitárias.
Segundo a RDC a trata-se desta forma de omissão de informação ou informações
enganosas por induzir ao erro.
Informação enganosa foi freqüentemente
observado em anúncios que afirmavam eficácia, segurança e menor custo. As
mensagens de menor custo usavam como referência revistas sobre preço de
medicamento. Mensagens econômicas são freqüentes em anúncios de medicamentos, mas
para respaldar afirmações eco-nômicas são necessários estudos farmacoeconômicos
comparando custos do tratamento e não os preços entre medicamento. Os
profissionais de saúde precisam estar mais atentos e desenvolver habilidades e
senso crítico sobre os materiais promocionais que recebem.
Os laboratórios farmacêuticos não têm a
preocupação de consultar as referências citadas ou verificar se a referência é
sobre o fármaco anunciado e se a comparação estabelecida são entre fármacos da
mesma classe terapêutica. Provavelmente os profissionais não têm o hábito de
avaliar criteriosamente os materiais recebidos, ficando desta forma mais susceptíveis
a influência das práticas promocionais.
Portanto faz-se necessária maior
discussão sobre o assunto. Propõem-se análises de conteúdo das propa-gandas de
medicamentos nos programas de graduação, projetos de extensão e cursos de
educação permanente aos profissionais já formados, a fim de promover o uso
racional e prevenir o uso abusivo dos medicamentos psicoativos e a influência
das práticas promocionais sobre os profissionais da saúde.
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Fontes:
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